Casal de professores vianenses ajuda a espalhar raízes de português em Timor

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Flor Gomes e Idílio Fernandes embarcaram em setembro de 2020 até Timor para dar aulas na escola portuguesa, em Dili. Quatro meses depois, este casal de professores vianenses admite que a língua portuguesa está-se a perder neste território, mas não hesita em querer continuar o trabalho junto dos alunos timorenses que mostram “muita vontade” de aprender em português.

Flor Gomes é professora de Educação Visual na Escola António Feijó, em Ponte de Lima. Idílio Fernandes dá aulas de Educação Musical na Escola do Monte da Ola, em Viana do Castelo. O casal de professores foi para Dili ao abrigo da mobilidade estatutária, continuando vinculados às suas respectivas escolas.

Ambos já têm mais de 25 anos de experiência na docência e conseguiram reunir, em 2020, as condições para cumprir “o sonho antigo que estava adormecido” que encaram também como uma “missão” em prol do desenvolvimento de um país que diz tanto a Portugal.

“Achamos que agora estava na hora de darmos uma reviravolta à nossa vida, indo para um país que fosse diferente do nosso e onde pudéssemos ser úteis e dar um contributo de Educação e Arte para melhorar a vida de quem está cá”, explicou Flor, confessado que, quando terminaram o curso, a ideia era partir logo numa aventura deste género.

“A experiência até agora está a ser muito positiva. Sentimos que os alunos querem muito aprender, gostam da escola e isso é uma mais-valia para o professor por perceber que o seu trabalho é reconhecido e visível diariamente. Os miúdos são felizes e alegres e manifestam logo o regozijo da aprendizagem e conquista. São afetuosos, carinhosos e efusivos quando conseguem fazer as tarefas”, contou Idílio Fernandes, 50 anos.

Este casal dá aulas na escola pública portuguesa em Dili, que aborda as mesmas matérias das escolas em Portugal, a alunos timorenses e outras nacionalidades, do 5º ao 9º ano. O funcionamento desta escola é garantido pelo Estado Português. “O grande objetivo é que toda a população aprenda português para que a língua não morra e Timor continue a manter esta ligação a Portugal”, explicou a professora de Educação Visual de 53 anos.

“Desafio enorme”

Apesar de lidarem com alunos que manifestam uma grande vontade de aprender, Flor e Idílio constatam que, nível educativo, há muitas dificuldades a serem ultrapassadas em Timor. “São alunos que têm imensas dificuldades porque português não é a língua que eles falam normalmente com as famílias. Sendo uma escola portuguesa, se os alunos em Portugal têm dificuldade, imagine alunos timorenses aprender o curriculum completamente português. Nessa medida, o nosso trabalho também é muito exigente, o que vale é que eles esforçam-se, mas é um desafio enorme”, admitiu Flor.

A ocupação indonésia fez com que o português fosse “morrendo” como língua em Timor, daí que o trabalho dos professores portugueses como Flor e Idílio, seja mais difícil. “Os timorenses mais velhos ainda falam português, mas desde a invasão, a Indonésia fez questão de banir a língua portuguesa no país. Durante esse período, o português ficou sendo esquecido e a língua tétum foi e é a mais falada até hoje”, referiu Idílio, indicando que, apesar disso, em algumas paróquias de Timor, o português ainda é falado nas missas, mas nada comparado às celebrações em língua tétum. “Eles são muito católicos e toda a gente vai à missa. A igreja é gigantesca e está sempre cheia. Nós vamos a uma missa celebrada em português que se enche de gente, mas antes realiza-se uma missa celebrada em tétum e a igreja está cheia na mesma”, contou Flor.   

“Sentimos como se fosse Portugal há mais de 40 anos…”

As dificuldades em Timor são transversais também a nível social e económico. “Timor é um país muito carente e foi um choque enorme quando aterramos e verificamos todas as carências que existem na arquitectura, habitação, falta de condições sanitárias e de higiene….sentimos como se fosse Portugal há mais de 40 anos”, acrescentou a professora.

O “copo meio cheio” desta experiência, refere, reside na “riqueza do coração” dos timorenses. “Quando falamos com eles, abrem-nos um sorriso enorme e são muito afáveis. Isso compensa tudo. Há uma simplicidade muito grande de vida que para nós também tem muito valor”, assegurou.

A viver num país cujas temperaturas rondam os 30 graus, Flor e Idílio admitem que essa é também uma mais-valia de se terem mudado de malas e bagagens para Timor. “E não só. As paisagens e a afabilidade das pessoas também são muito importantes”, frisa Idílio. A esposa garante que os timorenses os recebem e tratam “muito bem” porque são portugueses.

Pandemia? Quase não existe…

A pandemia em Timor está longe de causar o impacto que atualmente existe em Portugal. “Existem casos de covid, só que estão em isolamento e não podem sair, há um controlo muito rigoroso das autoridades. E se alguém entra no país, tem que ficar de quarentena obrigatória e só sai da quarentena depois de ter teste negativo”, frisou a professora.

Apesar de a pandemia estar aparentemente controlada em Timor, na escola onde Flor e Idílio trabalham existem as mesmas regras das escolas em Portugal. “Mesmo não havendo casos covid disseminados pela população, estamos desde setembro a trabalhar com as regras e medidas existentes em Portugal, usamos máscara, mantemos o distanciamento obrigatório, desinfecção das mãos, controle de temperatura…”, explicaram, indicando que nas escolas timorenses “essas regras não são seguidas”.

Flor e Idílio prevêem ficar em Timor até ao final deste ano lectivo. “Para já, ficamos até julho, mas depois vamos ver o que fazer. Se essa avaliação fosse feita hoje, queríamos continuar cá”, asseguraram.

Casados há 25 anos, Flor e Idílio admitem que estão a viver uma segunda etapa de vida e a aproveitar para se enriquecerem artisticamente. Paralelamente à docência, Flor é artista plástica e Idílio tem um grupo musical. “Fazia-nos falta mudar profissionalmente (…) além de sermos professores, também gostamos das nossas áreas artísticas e estamos aqui a receber novas ideias e inspiração para continuar os nossos trabalhos”, concluiu Flor.