Investigadores portugueses estudam variação genética das doninhas
Num estudo recentemente publicado na revista Molecular Biology and Evolution, investigadores do CIBIO-InBIO (Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos, InBIO Laboratório Associado da Universidade do Porto) identificam o gene responsável pelas diferentes cores na pelagem de inverno da doninha-anã, e mostram como esta variação genética poderá ser importante para a adaptação da espécie às alterações climáticas.
Várias espécies de mamíferos têm variações na cor da pelagem ao longo do ano: branca no inverno e castanha no verão. Esta característica permite que se mantenham camuflados em habitats com neve apenas no inverno, mantendo-se escondidos dos predadores ou das presas. No entanto, muitas destas espécies habitam também regiões com muito menor cobertura de neve no inverno. Nestas regiões, os indivíduos estão adaptados às condições locais, permanecendo castanhos todo o ano. Como as alterações climáticas estão a afetar a cobertura de neve em várias zonas do planeta, analisar estas adaptações a habitats com ou sem neve no inverno ajuda-nos a compreender como as espécies se poderão adaptar à mudança ambiental.
No trabalho agora publicado, uma equipa internacional liderada por investigadores do CIBIO-InBIO analisou vários genomas de doninhas-anãs (Mustela nivalis) para perceber qual o mecanismo responsável pelas diferentes cores de inverno que existem nesta espécie. Focaram-se em duas populações da espécie, na Suécia e na Polónia. “Estas zonas consistem em regiões da distribuição geográfica da espécie em que se verifica a coexistência de animais com pelagem castanha e com pelagem branca no inverno, oferecendo condições únicas para a identificação do ou dos genes responsáveis por esta variação de cor” esclarece José Melo-Ferreira, investigador do CIBIO-InBIO e coordenador do estudo.
Os resultados mostram que as diferentes cores de inverno se encontram associadas ao gene MC1R, identificando variantes genéticas que poderão alterar a função do gene e, consequentemente, a cor da pelagem. “Este gene tem um papel-chave na cadeia de produção de melanina, o pigmento que dá cor aos pelos e à pele em várias espécies, incluindo nos seres humanos”, explica Inês Miranda, estudante de doutoramento no CIBIO-InBIO e primeira autora do estudo.
Em conjunto com trabalhos anteriores do grupo em duas espécies de lebre, cujos resultados tinham associado outro gene da mesma cadeia – Agouti – às variações na cor da pelagem, os novos resultados na doninha-anã mostram como a mesma característica adaptativa pode ser originada através de diferentes genes em espécies diferentes. Isto mostra como diferentes soluções no mesmo caminho funcional – o de produção de pigmento – resolveram o mesmo problema – a adaptação a diferentes coberturas de neve.
Os investigadores detetaram ainda evidências de seleção natural na variação genética associada à cor castanha de inverno. Este é um resultado importante, pois indica que esta característica foi favorecida no passado, possivelmente em resposta a ambientes com menores coberturas de neve, onde a cor castanha permite uma melhor camuflagem. “Tendo em conta as reduções de cobertura de neve causada pelas alterações climáticas, ter pelagem castanha poderá ser favorecido também no futuro. A existência destas variantes genéticas pode ser um ingrediente fundamental para a adaptação destas espécies ao aquecimento global”, explica Inês Miranda.
Para chegar a estes novos resultados, os investigadores recorreram a colecções biológicas de Museus de História Natural, amostrando espécimes que foram recolhidos desde 1959. “As colecções de museu contêm ricas representações da biodiversidade existente no planeta. A aplicação de técnicas de análise genómica modernas a estes espécimes abre uma nova porta para a compreensão profunda de adaptações biológicas importantes, evitando a necessidade de novas amostragens. É como se ganhassem novas vidas para a ciência”, salienta José Melo-Ferreira.