Correram muitas lágrimas pelo fecho do “Iberia”, o restaurante com selo do Alto Minho que deliciou os americanos

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O histórico “Iberia”, restaurante de referência da comunidade portuguesa em Newark, fundado e gerido por alto-minhotos, fechou portas no domingo e dará lugar a um grande projeto imobiliário de mil milhões de dólares (940 milhões de euros), disse à Lusa o proprietário do estabelecimento.

A história do “Iberia” nos moldes que mantinha na atualidade remonta à década de 1970, numa atividade empresarial que se confunde com a de duas figuras muito conhecidas da comunidade lusitana: João Loureiro, natural de Vila Nova de Cerveira, e Jorge Fernandes, natural do concelho de Ponte de Lima, segundo explicou Jorge Santos, autor da obra “Os portugueses em New Jersey”.

Em 2015, a atividade empresarial do restaurante foi abalada com saída – do já falecido – João Loureiro, sendo substituído pela então esposa Hilda Loureiro, que, juntamente com Jorge Fernandes, garantiram nos anos seguintes a gestão do restaurante num período marcado pela significativa redução numérica da comunidade portuguesa e pelo crescimento de comunidades da América Latina na região.

Localizado na Ferry Street (Ironbound) – também conhecida como o coração do ‘Little Portugal’ devido à significativa comunidade portuguesa residente na cidade norte-americana de Newark -, o Iberia Tavern&Restaurant pôs fim a uma história de 49 anos no passado domingo, não tendo faltado lágrimas e recordações dos muitos eventos lá celebrados.

“Esta era uma casa visitada por gente de todo o mundo. Era um ponto de referência e as pessoas vão sentir falta – não só portugueses, como norte e sul-americanos. Tivemos muitas lágrimas aqui no domingo. Ao longo dos anos, o Iberia foi palco de muitas declarações de amor, festas de aniversário, casamentos, batizados…uma família chegou a casar quatro filhos aqui. E essas memórias ficaram nas pessoas”, contou à Lusa, em tom emocionado, Jorge Fernandes, dono do restaurante.

Enquanto falava com a Lusa, Fernandes foi interrompido por clientes que ainda não sabiam que do fim do “Iberia” e que procuravam uma mesa para almoçar, recebendo com espanto a informação do proprietário português: “Estamos encerrados definitivamente”.

A idade de Jorge Fernandes (77 anos) e Hilda Loureiro (76 anos), coproprietários do “Ibéria”, foi um dos motivos para venderem o estabelecimento, uma vez que “chegou o momento de se aposentarem e descansarem”, mas não foi um fator único.

De acordo com Fernandes, também a pesada inflação que se sente no país e falta de mão-de-obra pesaram na hora de se despedirem do restaurante e da respetiva propriedade, que tem uma área superior a cinco acres, ou seja, mais de 20 mil metros quadrados.

Este histórico restaurante dará agora lugar a um investimento imobiliário de grandes dimensões, muito devido à sua proximidade da estação ferroviária Newark Penn Station, que liga, entre outros, os estados de Nova Jérsia e Nova Iorque.

“Está a ser desenvolvido um projeto para 2.500 apartamentos que, tendo em conta os elevados preços de construção, custo da propriedade, entre outros, será de mil milhões de dólares. Este projeto pertence a um grupo de judeus ortodoxos de Brooklyn”, indicou o empresário português.

Sobre o impacto deste empreendimento numa localidade historicamente frequentada e habitada por emigrantes portugueses, Jorge Fernandes avaliou que se trata de um reflexo dos tempos e que o “progresso não pode ser travado”.

Após a oficialização da venda do restaurante, não faltaram clientes a elogiarem a trajetória do “Iberia” e a lamentarem o seu desfecho nas redes sociais.

“Este restaurante faz parte do que tornou o bairro do Ironbound popular. É muito triste que a comunidade portuguesa tenha desaparecido lentamente da área. Todos nós envelhecemos e mudanças precisam de acontecer, mas não é fácil ver este lugar desaparecer”, disse uma cliente na página do Facebook do “Iberia”.

“Certamente fará falta. Lembro-me de quando era criança e o meu pai nos levava lá para os melhores jantares de frutos do mar”, escreveu um outro cliente.

Também o lusodescendente Michael Silva, vereador pelo Bairro Leste no Conselho Municipal de Newark, usou as redes sociais para se referir ao “Iberia” como uma referência na gastronomia portuguesa e um marco na história do Ironbound.

“Foi aqui que muitos residentes começaram a sua vida, que muitos empresários aprenderam o ABC do sucesso, que muitas histórias se concretizaram. Como vereador, posso dizer que é um dia triste, mas ao mesmo tempo de esperança”, defendeu.

“Triste porque o Iberia foi uma grande referência para a nossa comunidade, um exemplo do que podemos conseguir com trabalho, dedicação e paixão pelo nosso apego aos valores da nossa própria história. De esperança, porque agora abrir-se-á um novo ciclo, com novas oportunidades e opções. O nosso bairro e os nossos residentes serão sempre a minha, nossa prioridade”, garantiu.