Queixas-crime por difamação são práticas para amedrontar

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Várias personalidades pediram ao parlamento e ao Governo a transposição “o mais rápido possível” da recente diretiva europeia em defesa da liberdade de expressão, protegendo jornalistas, ativistas e os cidadãos de tentativas de condicionamento do debate público.

Segundo os 21 subscritores do documento, que incluem Ana Gomes, Teresa Violante, Henrique Neto, Paulo Morais, João Paulo Batalha, Susana Peralta, entre outros, “50 anos depois da Revolução dos Cravos, e ainda que a censura administrativa e de Estado esteja formalmente extinta, novas formas de limitação da liberdade de expressão têm vindo a condicionar o debate público livre e esclarecido”.

A este propósito, alerta que “uma das principais é a litigância judicial contra ativistas, jornalistas, académicos e cidadãos, por parte de poderosos visados pela crítica e denúncia”.

Os autores da carta referem que “queixas-crime por difamação ou processos cíveis para reparação da honra e bom nome, a que são associados pesados pedidos de indemnização e elevadas custas de justiça, tornaram-se uma prática comum de assédio contra quem procura, através de mecanismos de participação pública, sociedades mais justas, igualitárias e informadas”.

Em seu entender, estas “formas de retaliação contra a participação pública, por parte de quem tem recursos, visam, através dos incómodos, condicionamentos e custos que os processos judiciais acarretam, amedrontar e limitar os que, de livre voz, se atrevem a apontar o dedo às irregularidades, transgressões ou faltas de ética. São, sobretudo, uma ferramenta de censura social e económica que usa meios públicos (os tribunais e demais estruturas judiciárias) a seu favor para calar vozes dissonantes”.

Os signatários do documento dirigido ao primeiro-ministro e ministra da Justiça, bem como ao Presidente da Assembleia da República e a todos os grupos parlamentares, salientam que “Portugal sofre particularmente com este abuso, graças a legislação e uma cultura judicial demasiado permissivas a esta litigância retaliatória”.

Os autores da carta recordam que, desde a adesão à Carta Europeia dos Direitos Humanos, em 1978, registaram-se mais de 30 condenações no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos por violação da liberdade de expressão dos seus cidadãos.

Para “manter livre a voz de quem, com espírito cívico, participa no debate público”, o Conselho da União Europeia e o Parlamento Europeu aprovaram este mês a diretiva anti-SLAPP/Strategic Litigation Against Public Participation, relativa à proteção das pessoas envolvidas na participação pública contra pedidos manifestamente infundados ou processos judiciais abusivos.

Por isso, solicitam ao parlamento e ao governo português que “procedam o mais rápido possível à transposição da dita diretiva, promovendo em Portugal um respeito alargado, fundado na lei, pela liberdade de expressão consagrada constitucionalmente, mas tantas vezes ameaçada nos tribunais”, o que seria um sinal de que “Portugal preza verdadeiramente os valores de abril”.

Francisco Teixeira da Mota, Eduardo Cintra Torres, Mário Frota, Margarida Mano, Luís de Sousa, Susana Coroado são alguns dos outros subscritores.