Barreiras burocráticas travam empresas portuguesas
As barreiras administrativas e regulamentares existentes em Portugal contribuem significativamente para a falta de competitividade da economia nacional. Segundo o “Position Paper n.º 1 de 2025” do Gabinete de Estudos da Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP), estas barreiras, em conjunto com outras distorções, explicam a 9.ª pior posição de Portugal entre os 38 países da OCDE e a 5.ª pior na União Europeia (UE) no índice de Regulação dos Mercados de Produto da OCDE – PMR 2023 (“Product Market Regulation”).
Da autoria de Óscar Afonso, diretor da faculdade, e de Nuno Torres, responsável pelo Gabinete de Estudos Económicos, Empresariais e de Políticas Públicas (G3E2P) da FEP, o estudo faz uma análise comparada minuciosa dos obstáculos regulamentares e barreiras à concorrência nos mercados de produto (bens e serviços) em Portugal face à OCDE e à UE (entre 26 estados-membros com dados), as duas áreas de referência usadas para comparação – de notar que, do total de 46 países avaliados, Portugal é o 15.º pior.
As situações de maior preocupação – em que estamos pior do que a mediana de países nas duas áreas de referência mencionadas, usando a base de dados do PMR 2023 da OCDE ocorrem em componentes importantes dentro das duas áreas do índice: as distorções da intervenção estatal; e as barreiras à entrada doméstica e estrangeira de empresas.
“Portugal precisa de maior eficiência regulatória e de menos barreiras à entrada nos mercados de produto para promover a concorrência e preços mais baixos, o que ampliará também a competitividade das empresas no exterior, o potencial da economia e o bem-estar da população”, afirma Óscar Afonso, diretor da FEP. “Reformas estruturais que reduzam as distorções do mercado e fomentem um ambiente mais competitivo e dinâmico são cruciais para que Portugal atinja patamares de maior crescimento económico e nível de vida”.
Segundo Nuno Torres, “há défices de competitividade na área das distorções da intervenção do Estado, designadamente nas componentes de impacto das regulações – efeito na concorrência, envolvimento de partes interessadas e regulação de lóbi –, de propriedade pública, quanto ao número de empresas públicas existentes e à sua governação, e de envolvimento em operações comerciais, ao nível da contratação pública e operações nos setores dos serviços”. Os défices identificados não se ficam por aí. “Na área das barreiras à entrada, essas barreiras são altas nos serviços e há um excesso de carga administrativa e regulamentar, pois estamos mal colocados nos requisitos administrativos para empresas, sobretudo nas em nome individual, e na comunicação e simplificação regulamentar”, afirma o responsável pelo gabinete de estudos da FEP.
O estudo distingue ainda dois setores de redes em que a regulação criou ambientes concorrenciais muito diferentes, usando informação adicional. “Nas telecomunicações temos o exemplo positivo recente da entrada de um novo operador romeno, que já provocou uma baixa assinalável de preços, embora as dificuldades noticiadas mostrem que subsistem algumas barreiras à concorrência”, afirma Nuno Torres. “Na ferrovia, porém, é evidente a falta concorrência, em particular no transporte de passageiros, pelo que se recomenda uma maior liberalização do setor, seguindo o modelo de sucesso de Espanha, bem como a revisão do Plano Ferroviário Nacional, para uma adoção alargada da bitola europeia, e a sua aceleração, após anos de atraso”.
Para melhorar os resultados de Portugal no índice PMR, os autores do estudo apresentam 20 recomendações prioritárias de um total de 40, das quais se destaca, em matéria de carga administrativa e regulamentar, a recuperação do mecanismo da “comporta regulatória”, também conhecida como regra “one-in, one-out”. Esta medida determina que, sempre que um novo ato normativo crie custos de contexto, outro de custo equivalente deve ser eliminado. Trata-se de uma medida que nunca terá sido implementada, apesar de estar prevista em Decreto-Lei há dez anos, aparentemente por falta de uma metodologia definida em Conselho de Ministros, como prevê o diploma que a criou.
“O adiamento sine dia deste mecanismo é um exemplo paradigmático do imobilismo e da pouca ambição dos nossos governantes ao nível da desregulamentação e da reforma do Estado em geral”, afirma Óscar Afonso. Segundo o diretor da FEP, “necessitamos de melhorar a avaliação de impacto legislativo, com realce para o processo de análise prévia de novos diplomas – em particular, a inclusão do seu efeito na concorrência – e o seu reporte, assegurando ainda que ela contribui, de facto, para a qualidade legislativa. Precisamos também de mecanismos em contínuo de avaliação do impacto da legislação existente, com vista à sua revisão, pois não basta analisar bem os novos diplomas”.
As conclusões do Position Paper nº1/2025 sustentam que a eliminação do excesso de regulação e burocracia, assim como das barreiras à entrada, é uma condição necessária para a atração de empresas estrangeiras, que potenciarão a concorrência no mercado doméstico. “A mudança deve estar inserida numa reforma profunda do Estado”, defendem os autores. “Outra condição necessária para impulsionar a atração de empresas e de investimento estrangeiro é a restauração da competitividade fiscal, sobretudo no IRC – onde temos a 2ª maior taxa efetiva da UE –, promovendo também a concorrência no mercado interno”.
Para os autores do estudo, “os investimentos e reformas do PRR poderão melhorar o índice PMR, mas o impacto será pequeno se não existirem revisões estruturais da regulação” como aquelas que o Position Paper recomenda.
Há 25 anos que os indicadores da Regulamentação do Mercado de Product – PMR da OCDE têm sido a principal métrica dos ambientes regulamentares para a competitividade empresarial. Estes indicadores avaliam o alinhamento do quadro regulatório de cada país com as melhores práticas internacionais, medindo os obstáculos à fixação de empresas e à concorrência, tanto a nível económico como setorial.