Padre Fontes começou a recolher provérbios aos 10 anos

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O padre António Fontes dedicou a vida a estudar e a preservar as tradições, história e cultura do Barroso, reunindo mais de 3.000 livros e 80.000 documentos que doou ao Ecomuseu, em Montalegre, para os disponibilizar à comunidade.

São milhares de manuscritos, livros, jornais, revistas e fotografias que o sacerdote de 85 anos quis doar ao Ecomuseu do Barroso – Espaço Padre Fontes, cuja sede está instalada em Montalegre. “Para mim já não são úteis e têm um valor incalculável”, afirmou à agência Lusa António Lourenço Fontes, que disse querer que o seu trabalho seja, agora, “útil à sociedade”.

O padre, que ficou conhecido pela realização do Congresso de Medicina Popular de Vilar de Perdizes, referiu que o seu arquivo tem um valor social, cultural, turístico, arqueológico, científico e que representa décadas de trabalho, estudo e investigação sobre o Barroso, território que se estende pelos concelhos de Boticas e Montalegre, no norte do distrito de Vila Real.

Foi num café em Vilar de Perdizes, aldeia onde reside, que a Lusa o encontrou, a preparar-se para mais uma tarde de jogo de cartas com as mulheres. A sofrer de uma doença degenerativa e progressiva, o sacerdote disse que faz questão de sair diariamente de casa para caminhar um pouco, conviver, para falar, realçando ainda que o jogo de cartas lhe faz bem à memória. Também as gargalhadas partilhadas o levam a este café onde as suas parceiras de jogo comentam a brincar que o padre “faz muita batota”.

Foi aos 10 anos, contou, quando entrou para o seminário de Vila Real, que começou o seu arquivo sobre a região. “Comprei uma caderneta de bolso para apontar as coisas que ouvia às pessoas da minha terra e acontecimentos. Foi logo aí que comecei a recolher os provérbios e ditados populares”, referiu.

No Ecomuseu foi criada a sala “Fundo Padre Fontes” onde está, agora, guardado o arquivo do sacerdote. “Todo o espólio e todo o trabalho que recolheu ao longo da sua vida doou ao município, ao Ecomuseu do Barroso, para termos aqui à disposição das pessoas”, afirmou Nuno Rodrigues, responsável do Ecomuseu.

São, contabilizou, mais de 80.000 documentos e 3.000 livros que se traduzem “numa base muito grande sobre a história e a cultura” desta região e que pode ser consultada por estudiosos, académicos ou apenas curiosos.

“Estamos a terminar a digitalização de todos os documentos que vão ficar disponíveis ‘online’ e a maior parte fala sobre a região, sobre o Barroso e a Galiza, porque o padre Fontes também tem muita ligação com a Galiza”, acrescentou.

No arquivo há informação sobre os mais variados temas, desde o Congresso de Medicina Popular de Vilar de Perdizes, a sexta-feira 13, sobre a arqueologia, história, cultura, as ervas e o seu poder medicinal.

“Tudo o que possam imaginar sobre trabalhos que, quer ele realizou, quer documentos que foi recolhendo ao longo da vida, como cartazes, notícias de jornais, tem ali tudo e foi esse o trabalho que o padre também entendeu que queria mostrar a toda a gente”, frisou Nuno Rodrigues.

O responsável referiu que a catalogação e a digitação é um trabalho que vai prosseguir. “Cada vez que vamos a casa dele descobrimos mais qualquer coisa ou ele traz também mais alguma peça ou outro trabalho que tenha”, sustentou. O sacerdote, segundo Nuno Rodrigues, fez questão de ajudar a catalogar e a fazer todo o trabalho técnico.

Em 2023, António Lourenço Fontes foi nomeado embaixador do Alto Tâmega e Barroso, num iniciativa da comunidade intermunicipal desta região. Nasceu na localidade de Cambezes do Rio, em Montalegre, ganhou protagonismo por impulsionar o Congresso de Medicina Popular de Vilar de Perdizes, é ainda um dos rostos da sexta-feira 13, um estudioso e defensor das plantas medicinais, foi escritor, hoteleiro e emprestou o nome ao Ecomuseu.

O congresso de Vilar de Perdizes realiza-se desde 1983 e despertou a curiosidade pública para esta aldeia e para o padre que transformou o misticismo numa atração turística. Foi precisamente a junção do sagrado e do profano protagonizado por um padre que deu mais-valia e chamariz ao congresso.

“O padre Fontes é a figura maior que Barroso e o Alto Tâmega têm. Foi uma pessoa que ao longo da sua vida sempre defendeu e tentou mostrar o que de bom nós temos. Teve sempre essa preocupação (…) A nossa obrigação é perpetuar o nome dele”, realçou Nuno Rodrigues.