Ponte Eiffel de Viana do Castelo (1878-2022): 144 anos de resistência

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Rui Manuel Marinho Rodrigues Maia  

Licenciado em História, Mestre em Património e Turismo Cultural pela Universidade do Minho - Investigador em Património Industrial.

A Ponte Eiffel sobre o rio Lima, em Viana do Castelo, comemora dia 30 de junho 144 anos de verdadeira resistência, ao serviço das comunidades e do progresso. O rendilhado, feito em ferro pudlado e rebitado, pela famosíssima Casa Eiffel de Paris, confere à Princesa do Lima uma identidade única, caracterizada pelo arrojo e pela coragem das gentes do século XIX, transportando para o presente as forças do porvir.

Em 1839, a Rainha D. Maria II, ordenou através de Decreto de 17 de maio, a substituição da velha ponte de madeira sobre o rio Lima por uma ponte de pedra. Todavia, essa ideia acabaria descartada, sendo substituída pelo plano de uma ponte ferroviária.

Em 1872, a 14 de junho, foi publicado o Decreto que ordenava proceder à construção do Caminho de Ferro do Porto à Galiza, por Braga e Viana do Castelo – Linha do Minho.

Em 1876, a 21 de fevereiro, em Sessão Extraordinária, a Câmara Municipal de Viana do Castelo solicitou ao Governo de sua Majestade que fosse projetada uma ponte com dois tabuleiros paralelos ao mesmo nível do Cais, contudo, a configuração da ponte acabaria por ficar como é atualmente, com dois tabuleiros sobrepostos. O projeto da ponte foi aprovado na sua forma última por Portaria de agosto de 1876, os trabalhos de construção arrancaram em março de 1877, e toda a obra foi dada por concluída em maio de 1878, data em que, pela primeira vez, passou uma locomotiva a vapor pela ponte. A ponte foi oficialmente inaugurada a 30 de junho de 1878, contando com a presença de António Maria de Fontes Pereira de Melo (1819-1887), que era o presidente do Conselho de Ministros. A Obra de Arte exigiu que fossem empregues 2 062 436 kg de ferro, tendo custado naquele tempo 342 contos, o que representava muito dinheiro. A Ponte Eiffel mede aproximadamente 563 metros de comprimento e 6 de largura, caracterizando-se pelos seus dois extensos viadutos de acesso, com mais de 80 metros cada. Na parte superior contempla a rodovia, dando continuidade à estrada nacional 13, e, na parte inferior, a ferrovia – Linha do Minho. A cidade sofreu transformações profundas do seu plano urbanístico aquando da implementação da ferrovia, da Ponte Eiffel e do edifício da Estação de Caminhos de Ferro. No fundo, o que sucedeu tinha que ver com a necessidade de encontrar espaços onde implementar as linhas férreas, criando as devidas condições de acesso à nova travessia, e, também, beneficiar o acesso à Estação de Caminhos de Ferro. Entre o rasgar e o alterar de ruas, expropriações, demolição de edifícios ou outras necessidades, talvez a transformação mais marcante tenha sido a abertura da Avenida dos Combatentes da Grande Guerra (1917-1922) que, desde a zona ribeirinha, nos convida a subir esse trajeto até alcançar a bela Estação de Caminhos de Ferro, obra do Eng.º Alfredo Soares, concluída em 1882.

Entre umas largas dezenas de pontes e viadutos fabricados pela Casa Eiffel de Paris para a construção das várias linhas ferroviárias portuguesas, poucas restam como testemunhos desse tempo. Na região Noroeste de Portugal à exceção da travessia do rio Lima, que tem desafiado os tempos, apenas sobrevive a velha ponte que atravessava o rio Âncora, em Caminha, atualmente maltratada e abandonada na Póvoa de Lanhoso. Outras, como a travessia do rio Cávado em Barcelos, ou a travessia do rio Neiva, tiveram como destino a sucata no último quartel do século XX. A travessia metálica rodoferroviária do rio Lima encontra-se desde 2019 em processo de classificação como MN – Monumento Nacional, de acordo com o n.º 5 do artigo 25.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro.

Nos dias de hoje devemos celebrar o arrojo da arquitetura do ferro, marcada pela leveza e transparência das suas Obras de Arte. Trata-se de Património Industrial ferroviário de valor incalculável, que encerra valores de memória e identidade. As pontes e os viadutos, independentemente da sua natureza, são atalhos que o Homem criou para vencer as vicissitudes de um mundo tantas vezes agreste e distante pela sua própria natureza. Encurtar caminhos, e aproximar-se de si mesmo, foi um dos grandes propósitos que levou a humanidade ao longo de milénios a fazer chão onde ele não existia.