A Igreja “Românica” de São Salvador de Rebordões Souto

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Rui Manuel Marinho Rodrigues Maia

Licenciado em História pela Universidade do Minho

No local de implantação deste belo exemplar arquitetónico da força da fé, erguido provavelmente no século XIII (1255), vislumbra-se a freguesia de Rebordões Souto. A Igreja, embora preserve reminiscências da sua fundação – traços Românicos – possuiu uma frente onde o Barroco se manifesta de forma cabal. Há neste local uma aura que agrega um misto de vida, de morte, e de esperança. Os rituais religiosos, confrontam-se com a rápida mudança de paradigma, de uma sociedade que se reinventa, esquecendo cada vez mais os dogmas, que em tempos mais recuados pautavam o quotidiano das suas gentes.

A mudança, refletida no desleixo que aqui impera, como na Casa Paroquial, em absoluto estado de abandono, afirma outros tempos, em que o Clero era pujante, vendo agora ruir a sua força e, por consequência, vê cair os dividendos a que tão habituado estava, fruto de uma sociedade amordaçada pela ignorância, que julgava comprar o paraíso com dinheiro. Rebordões Souto, que antes se denominava “São Salvador do Souto”, foi Sede do Concelho de Souto de Rebordões, extinto na primeira metade de Oitocentos, do qual fazia parte a freguesia vizinha de “Santa Maria Rebordões”, atualmente denominada Rebordões Santa Maria. O extinto Concelho tinha importância maior, remontando as suas origens ao edificar da nacionalidade, ao longo da sua riquíssima história recebeu sete Forais, que gradualmente lhe atribuíam novos privilégios. Não admira, portanto, que a sua Igreja seja um livro aberto, cujas paredes falam, falam para dentro e para fora. Os espíritos, através da arte, cunhada em todo o templo, mostram-se aos simples mortais, murmurando-lhes, lembrando que a vida, essa coisa efémera e vil, não passa da feição que lhe damos, abraçando-se no granito esculpido, na talha, nos nichos, e em tudo que serve de caminho à vida celeste. O tempo, diz-se, muda as vontades, e partindo dessas novas perceções se transforma o que nos rodeia.

Nada é mais dinâmico que a vida, e nada é mais estático que a morte, e em nome dela se erguem as mais belas Obras de Arte. Na verdade, nada mais atormenta tanto o Homem como a sua ignorância face ao porvir, o post mortem. Assim, temendo o desconhecido, se cultivam rituais, que passam gerações, na esperança que, in solidum, a vida nos seja devolvida – resgatada das cinzas. Ora, apartando-nos desta reflexão, importa salientar que a planimetria da Igreja foi alterada no século XVIII, particularmente na sua primeira metade, prolongando-se a capela-mor, redecorando-a ao estilo Barroco. Os retábulos da capela-mor e da capela do Sagrado Coração de Jesus são do estilo Nacional, ao passo que os dois laterais são Joaninos. A Igreja é composta por uma planta longitudinal, com nave única, capela-mor retangular profunda, possuindo adossada transversalmente dois corpos retangulares, a capela lateral e a sacristia. A Igreja possui um lindíssimo frontão triangular, e em cima, um óculo quadrilobado, muito bonito.

Em 1934 a antiga sineira foi substituída pela atual torre sineira, que se encontra ligeiramente recuada, contendo um belo relógio, o acesso à torre é realizado por escadaria interior. Ao redor do templo, o espaço é abundante, permitindo o caminhar fácil e, na parte traseira, ladeia o Cemitério, onde se encontra uma das suas entradas, uma vez que possuiu uma outra junto à estrada, mais abaixo. Junto ao portão de cima, vislumbra-se um belo cruzeiro que, pela inscrição no granito, nos remete para 1642, ao lado esquerdo deste, encontra-se a antiga Casa Mortuária, que hoje serve de espaço à catequese, onde também se encontra uma pequena fonte de água. A vida por estas bandas parece passar abraçada ao raiar do sol, à brisa que corre por entre o verde da natureza, a labuta nos campos, o cantar dos pássaros, tudo se resume ao essencial, de nada mais precisam os Homens.

Cristo, transfigurado, é São Salvador,

crueldade e morte, a sua fé no Senhor.

Aqui, ergue-se essa fé, a olhos vossos,

Deus, luz, salvação, vida sem remorsos.

A morte, mais não é que uma provação,

o caminhar aos céus, pela sua evocação.