“Nunca tivemos a intenção de o matar”
Os dois homens acusados do homicídio qualificado de Vítor Coimbra, o pescador de 22 anos natural de Viana do Castelo que foi esfaqueado nas costas em dezembro de 2018 na Areosa, admitiram em tribunal a agressão com uma faca de cozinha, mas garantiram que “nunca” tiveram a intenção de matar.
Os dois arguidos, de 29 e 34 anos, quiseram falar no início do julgamento, que ficou marcado por momentos de tensão à porta do tribunal de Viana do Castelo, protagonizados por familiares da vítima. A PSP foi obrigada a formar um cordão humano para permitir que a carrinha que transportou um dos arguidos do estabelecimento prisional de Braga pudesse entrar no parque do edifício.
No início do julgamento, e face à agitação que se vivia no interior do tribunal, a juíza que preside ao coletivo avisou que não iria permitir qualquer tipo de desacatos.
O outro arguido, em prisão domiciliária com vigilância eletrónica, já na sala de audiências, quando prestava declarações, disse ter sido ameaçado pelos familiares do jovem assassinado quando entrava no tribunal.
Perante o coletivo de juízes que preside ao julgamento, o arguido, de 29 anos, disse que “nunca” teve intenção de matar. “Nunca quis matar. A minha intenção não era fazer nada com ela”, referindo-se à faca de cozinha que escondeu na meia da perna direita, sublinhando que era “apenas para proteção”.
O outro acusado, de 34 anos, disse também “nunca” ter sido sua intenção “ferir ninguém, quanto mais matar”.
“Queria falar, pedir que parasse com as mensagens e ameaças. Nem tive tempo de falar porque partiu logo para a agressão”, afirmou o arguido.
Os dois homens são acusados em coautoria material e na forma consumada de um crime de homicídio qualificado, cuja moldura penal oscila entre os 12 e os 25 anos.
O pescador de 22 anos, pai de três crianças, uma nascida já após a morte, foi esfaqueado nas costas em dezembro de 2018, na Areosa. Ainda foi transportado ao hospital de Santa Luzia, em Viana do Castelo, em estado grave, acabando por morrer menos de 40 minutos depois de ter dado entrada naquela unidade hospitalar.
Segundo a acusação deduzida pelo Ministério Público, o pescador foi esfaqueado quando saiu em defesa de um amigo que tinha ido visitar, o principal visado do “corretivo” que os dois homens tinham planeado “por aquele andar a incomodá-los, bem como às respetivas namoradas, enviando mensagens de cariz sexual”.
No dia em que ocorreram os factos, os dois arguidos, que viviam juntos numa casa em Vila Nova de Cerveira, deslocaram-se de carro, acompanhados das namoradas, à freguesia de Areosa, em Viana do Castelo. Afirmaram que queriam “falar” com o autor das mensagens ameaçadoras, explicando que na origem daquelas mensagens estaria um relacionamento amoroso que uma das duas jovens teria mantido com o homem.
No tribunal, durante o depoimento que durou quase três horas, os dois arguidos referiram que recebiam “mais de mil” mensagens por noite, com ameaças e insultos, e que o encontro combinado entre as partes pretendia pôr fim às mesmas.
O arguido que esfaqueou o jovem que acabou por morrer disse que “não houve um plano prévio”, e que não conhecia pessoalmente o autor das mensagens, mas sabia que “era perturbado, que consumia álcool e drogas”.
“Nunca teria ido se soubesse o que ia acontecer”, disse, justificando que a facada que desferiu foi uma “reação” ao “murro” de que foi alvo por parte da vítima. “Quando espetei a faca nas costas dele fiquei logo com o cabo da faca na mão, entrei em pânico e fugi, porque temi pela minha vida, pensei que ia morrer ali”, observou.
Já o arguido de 34 anos declarou que ficou a saber que o amigo levava consigo uma faca quando se encontravam no carro, a caminho da casa do autor das mensagens. “Disse-lhe que não a levasse porque não ia ser preciso”, referiu, admitindo que quando saiu do carro não confirmou se o colega a levava.
Acrescentou que, depois deste caso, ambos foram “várias vezes ameaçados de morte, até dentro do estabelecimento prisional de Braga, por três detidos de Viana do Castelo”. “Tivemos de ser protegidos por outros reclusos e pelos guardas prisionais”, afirmou.