Arcos de Valdevez deu “energia” a Daniela Falcão para tornar-se cientista do hidrogénio

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Depois de muita indecisão, Daniela Falcão decidiu construir uma carreira profissional dedicada à ciência. A cientista de Arcos de Valdevez investiga as propriedades do hidrogénio para produzir eletricidade e considera que ter crescido em Prozelo moldou a sua personalidade.

A cientista de 41 anos é natural de Prozelo, freguesia onde cresceu. “Foi bom crescer nesta freguesia. Tinha uma vizinha da minha idade e brincávamos muito juntas. Eu gostava de apanhar amoras, de brincar com as barbies e de ir até ao rio Toural. A minha amiga tinha uma piscina e também brincava lá”, recordou, assumindo que crescer neste local moldou a sua personalidade.  “Sou uma pessoa calma e isso pode ser por causa do local onde cresci. Não há muito stress aqui”, constata Daniela Falcão, que elege a natureza como o aspecto que mais gosta em Arcos de Valdevez. Apesar da infância passada em Prozelo ter sido agradável, a cientista confessou que só começou a gostar da escola no segundo ciclo. “Não havia muitas crianças na escola quando andei na primária.  Por isso, o contexto não foi muito agradável. Mais tarde, consegui ter contacto com mais crianças e com mais professores e mantenho muitas dessas amizades”, confessou.

Na infância, a investigadora não brincava com algo que lhe tenha despertado o gosto pela ciência. Quando enveredou pelo curso de ciências e tecnologias no secundário, não tinha a certeza do que iria fazer no futuro. “Fui para ciências porque era a área que dava mais opções. Fiquei indecisa entre as áreas da engenharia química e de psicologia, que não têm nada a ver uma com a outra”, partilhou. Mais tarde, Daniela decidiu formar-se em Engenharia Química na Universidade do Porto. “Achei que era um curso versátil e que dava para trabalhar com muitas áreas. Sempre gostei de matemática por ser um ciência exacta e de química por conseguir trabalhar com a interação entre as moléculas”, explicou. Mas nesta altura uma carreira na investigação ainda não se colocava. “Gostava da área da indústria. Contudo, tive uma  disciplina que se chamava projeto de investigação. Trabalhei sobre o hidrogénio num trabalho de laboratório e isso despertou o meu gosto pela ciência”, confessou a cientista, que, no doutoramento, aprofundou conhecimentos nesta área. “Usei hidrogénio para produzir eletricidade através de células de combustível. A minha motivação foi trazer mais sustentabilidade porque os combustíveis fósseis vão acabar”, antecipa.

Para Daniela Falcão, a ciência é uma área que está em constante mudança, o que a fascina. “A investigação faz-me pensar e eu gosto disso. Se mudar alguma coisa no processo tenho que ver o que acontece e isso traz inovação à investigação. Por isso, sinto-me realizada, apesar de achar que seria também feliz noutra profissão. Ensino ou moda, por exemplo. No entanto, estou bem onde estou”, reiterou a cientista e investigadora na Universidade do Porto. “Ser investigadora auxiliar na Universidade do Porto é muito bom. Estou na área de gestão de projetos e oriento alunos em mestrado e em doutoramento.  Também tento ganhar bolsas para projetos e comprar equipamentos para que eles sejam bem executados”, explicou. “Também dou aulas nos laboratórios da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Consigo rever-me em alguns alunos, mas isso não acontece com todos.  Por isso, também aprendi a ser mais tolerante”, assumiu.

Daniela Falcão tem dois filhos. Assegurou que não foi difícil conjugar o papel de cientista, mulher e mãe. “O pai dos meus filhos e a minha sogra ajudam muito e  na faculdade tenho um horário flexível”, explicou, admitindo que passou por algumas dificuldades no nascimento dos seus filhos. “Terminei a tese de doutoramento três meses depois da minha filha nascer e foi uma altura crítica. Quando nasceu o meu filho mais novo não estive com ele o tempo que gostaria porque estava a terminar de escrever um livro”, contou. “Existem concursos que têm em atenção a maternidade das cientistas porque isso tem um impacto muito grande na carreira, principalmente se os filhos são pequenos”, considerou. A cientista acredita também que a comunidade científica começou a ver com outros olhos as mulheres. “Há menos machismo nesta profissão, até porque  tem que existir o mesmo número de homens e mulheres em determinados lugares. Confesso que nunca senti nenhum tipo de discriminação por ser mulher ou mãe”, assegurou, acrescentando que os seus filhos já tem um bichinho pela ciência. “Os meus filhos adoram ir à mostra da Universidade do Porto e também mostravam muito interesse quando eu fazia experiências em casa”, partilhou.

Actualmente, a investigadora está a promover a sensibilização científica. “Faço palestras nas escolas sobre o hidrogénio para desmistificar algumas ideias. Com este elemento químico temos que ter em conta alguns aspetos de segurança, mas não é aquele bichinho de sete cabeças que costumam dizer”, explicou Daniela, mostrando-se agradada com o reforço da ciência nos planos curriculares das escolas. “É essencial investir em laboratórios nas escolas porque é melhor praticar do que estar numa sala de aula a ler sobre esse assunto. Quando somos nós a fazer as coisas temos uma percepção completamente diferente”, notou a cientista.

Daniela Falcão mostrou-se agradada com o crescimento de Arcos  de Valdevez. “Tem crescido de uma forma gradual. Um aspeto que cresceu muito foi a área da natureza. Temos, por exemplo, mais ecovias no concelho. Na vertente da ciência, a autarquia também fez um grande investimento com a construção das Oficinas de Criatividade Himalaya”, reconheceu a cientista, que integra o projecto arcuenses com ciência.

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