Padre, professor, capelão e revolucionário: João Oliveira Lopes morreu aos 84 anos
Faleceu o padre João Oliveira Lopes, aos 84 anos. Natural de Grimancelos, em Barcelos, o padre Lopes esteve sempre ligado a paróquias de Ponte de Lima. Foi professor e director na Oficina de São José. O funeral realiza-se esta quinta-feira, dia 23 de Novembro, às 16:00h na Igreja paroquial de S. Mateus de Grimancelos.
Em entrevista ao jornal “Alto Minho”, na edição de 6 de fevereiro de 2014, o padre Lopes contou que o momento que mais o marcou na sua vida sacerdotal foi vivido na paróquia da Boalhosa, onde diz ter sido vítima de “perseguição”.
João de Oliveira Lopes nasceu na freguesia de Grimancelos, em Barcelos, a 1 de Abril de 1938 – mas só foi registado no dia seguinte – no seio de uma família abastada “à custa de muito trabalho”.
Entrou para a escola primária e confessa que no primeiro ano “estreou-se a dar porrada na professora”. “Foi uma brincadeira. A professora tinha critérios de castigo com os quais não concordava. Quando batia, batia a sério. Uma vez deu-me ordem de castigo e parti a lousa na cara. Fiquei com o caixilho na mão e ela depois deu-me um arraial de porrada”, conta padre João Lopes.
Jogava futebol, onde também era conhecido pelas suas entradas mais duras, mas o seu desporto de eleição era o voleibol. Concluída a quarta classe, ingressou no seminário, apesar do desejo de ser músico e frequentar o conservatório. Foi lá que estudou.
Também a tropa lhe dizia algo, influenciado pelo gosto do pai. “Dizia que se aos 18 anos tivesse 1,80 metros ia para a tropa, mas, como não concebia que um atarracado como eu fosse para a tropa, desisti”, comentou.
Apesar de frequentar o seminário e de fazer parte de uma família ligada à igreja, confessa que “no dia- a-dia, só se não pudesse, fugia de ir à missa”. Por influência de um irmão, a sua “alma gémea”, como afirma, decidiu seguir a carreira sacerdotal. “A decisão dele incentivou-me. Não me dava sem ele e ele sem mim. Éramos almas gémeas. Foi por influência dele que fui para sacerdote”, relembra.
Conta ainda que no seminário era “preguiçoso” e fez “trinta por uma linha”. Da decisão de ter optado pelo sacerdócio garante não estar arrependido.
Foi ordenado sacerdote a 21 de Setembro de 1963 e a 8 de Outubro chegou ao concelho de Ponte de Lima. “Recebi a comunicação que tinha de ir para Ponte de Lima para a Oficina de São José, na Vila Moraes. Quando cheguei foi um balde de água fria. Fui ter com o padre Carlos, o arcipreste que me requisitou”, recorda padre Lopes.
Porém, a sua entrada não foi pacífica e garante que “Cónego Correia fez perseguição” à sua pessoa. “Mas como eu era Director de Carreira passou a perseguir os meus monitores”, revela.
Esteve na Oficina São José até 1982, mas entretanto já era responsável por duas paróquias, a da Boalhosa, desde Novembro de 1968, e da Seara, desde Janeiro de 1977. Entre 1984 e 1988 foi pároco em Vitorino de Piães.
Foi durante a sua missão pastoral na Boalhosa que viveu o período mais conturbado. “Até 2000 não foi nada fácil. Em 1998 deixei de receber porque o presidente da Junta de Freguesia de então chamou a si a administração da igreja e apropriou-se dos bens da igreja. Eu protestei, a diocese devia ter reivindicado, mas nada foi resolvido”, conta padre Lopes.
O padre sublinha que foi “parar à Boalhosa porque ninguém queria ir para lá”. “Havia muita miséria. Dinamizei a paróquia o mais que pude. Fiz tudo. Há gente que tem casa e não tinha se não fosse eu. Até fiz o pedido para a estrada”, assinala.
O padre Lopes afiança que “nunca houve problemas com os paroquianos”, guardando “boas recordações”, mas diz ter sido “perseguido” pelo autarca local. “Dei o meu máximo. Completei 45 anos de sacerdócio na Boalhosa o ano passado e decidi sair”, comenta.
Na Seara foi o responsável por erguer o salão paroquial, pois “na altura não havia nada para a juventude”. Já em Vitorino de Piães esteve apenas quatro anos.
O padre Lopes, que também já foi capelão do Hospital Conde de Bertiandos, celebra actualmente a missa do meio-dia na igreja da Misericórdia, na vila, uma eucaristia bastante participada e também conhecida por ser rápida. “Não é tão rápida quanto a gente quer. A maior parte que participa é de fora, mas grande parte também é a ‘nobreza’ de Ponte de Lima. Tento passar a mensagem de que pelo facto de terem nascido em berço de ouro não se ponham em pontas de pés, não puxem pelos galões”, conta o padre Lopes.
O sacerdote é também conhecido por ajudar os mais carenciados e afirma mesmo que tem “ajudado muitos”. “Tenho tido prejuízo, tem sido a minha desgraça”, refere, estando sempre presente para quem precisa.
Um dos passatempos que tinha desde os 8 anos era o de ser caçador, acompanhando o pai. “Agora reduzi devido a um problema de saúde que tive o ano passado. Vou caçar almoços. É raro o domingo que não vá, no final da missa. Vou ter com um grupo e agora é para o convívio”, nota.
A viver em Ponte de Lima há várias décadas, afirma que o regresso à terra natal já não será “em vida”. “Morto ainda não sei”, finaliza.