Águas residuais das ETAR vão ser “sentinela” da Covid

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A deteção do vírus SARS-CoV-1 nas águas residuais permite identificar precocemente novos surtos e vai estender-se a todo o país, tendo um projeto piloto detetado duas mutações de variantes antes de as autoridades de saúde saberem.

O projeto piloto Covidetect decorre desde o ano passado e os resultados preliminares foram apresentados em Lisboa, na Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) de Alcântara, com os responsáveis a explicar que os dados recolhidos nas águas seguiram a par da evolução diária da pandemia de covid-19 nos últimos meses.

Com o projeto foi possível detetar, em Gaia, mutações das variantes com origem na Califórnia e da Nigéria do vírus que provoca a doença covid-19.

O projeto piloto termina em agosto, mas o ministro do Ambiente e Alterações Climáticas, João Pedro Matos Fernandes, que esteve na cerimónia, garantiu à Lusa que a análise das águas das ETAR vai continuar e alargar-se.

“Claramente sim”, disse o ministro sobre a continuação do projeto, cujos resultados mostraram ser possível detetar o vírus e as suas variantes nas ETAR.

João Pedro Matos Fernandes salientou que para já nem todas as ETAR estão preparadas para fazer essa deteção, mas que é “absolutamente essencial” estender o projeto piloto, para que a análise das águas passe a ser “uma regra comum das ETAR em todo o país”.

As ETAR que venham a ser construídas ou remodeladas terão de estar preparadas para este tipo de análises.

O projeto piloto foi aplicado a cinco ETAR, em Lisboa, Cascais, Gaia e Guimarães, e foi ainda monitorizada a circulação do vírus nas redes de drenagem dos efluentes de três hospitais.

A ministra da Saúde, Marta Temido, que também participou na apresentação dos resultados preliminares do Covidetect, considerou-o um “instrumento poderoso” para lutar contra a pandemia atual e futuras pandemias, salientando a importância de atuar precocemente sobre fenómenos de risco.

O projeto é, disse, a oportunidade de haver um sistema de notificação em tempo real às autoridades de saúde, e tem “um valor enorme” no “arsenal de resposta à pandemia”.

A fase seguinte do projeto envolve a disseminação dos resultados e a criação de um sistema de alerta em tempo real para notificação das autoridades de saúde e ambiente sobre a reemergência do vírus.

O Covidetect foi lançado em abril do ano passado e financiado pela União Europeia, estando a ser desenvolvido por um consórcio que junta empresas do grupo Águas de Portugal (AdP), a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e o Laboratório de Análises do Instituto Superior Técnico.

Foram analisadas 760 amostras de águas residuais, entre 27 de abril e 2 de dezembro de 2020, “confirmando-se que os dados obtidos para SARS-CoV-2 a partir das águas residuais não tratadas seguiam, de forma bastante ajustada, os novos casos diários reportados para as regiões em que se encontram as ETAR testadas neste estudo”, dizem os responsáveis.

Na cerimónia também foi explicado que nas águas residuais tratadas foi detetada a presença de material genético do vírus, mas sem capacidade infecciosa.  

Os responsáveis pelo projeto têm colaborado com a Comissão Europeia na iniciativa de tornar as águas residuais sentinelas da presença do vírus. A Comissão já fez uma recomendação no sentido de haver uma abordagem comum na vigilância do SARS-CoV-2 e das suas variantes nas águas residuais da União Europeia.

 Nuno Brôco, vice-presidente da AdP VALOR (empresa do grupo AdP e líder de consórcio), lembrou que a Comissão Europeia recomendou que todos os Estados-membros implementem este sistema até 31 de outubro deste ano, e acrescentou que Portugal está em condições de o fazer até antes.

A recomendação indica que devem ser monitorizadas ETAR com dimensões acima de 150 mil habitantes.

O responsável disse que o atual projeto, que é piloto e que não envolveu grande quantidade de ETAR nem análises em contínuo, permite com uma antecedência de alguns dias (quatro por exemplo) ter dados sobre um aumento da carga viral num determinado local. “Pretende detetar tendências de crescimento ou decréscimo” da carga viral, disse.

Países como a Austrália ou a Nova Zelândia já estão a usar as ETAR como “sentinela”, criando um sistema ‘online’ em que as ETAR surgem com uma cor verde, que passa a vermelho quando é detetado material genético do vírus.